Por Dom
Henrique Soares.
Leia Gn 15,1-15.
Nesta perícope a Palavra de Deus apresenta-nos uma misteriosa quadra da vida de
nosso Pai Abraão. Já idoso, cerca de vinte e cinco anos após tudo deixar por
Deus, na esperança de uma descendência e uma terra para essa descendência,
Abrão vê-se cansado de esperar, quase que enganado por esse Deus independente
demais, misterioso demais, que sempre nos desconcerta...
E ele, em plena
noite, no interior da sua tenda, sente-se oprimido e mergulhado numa medonha
tristeza, daquelas que apertam o coração e acabam com o ânimo, fazem vacilar a
esperança e ameaçam a fé...
O Senhor o consola.
E ele desabafa: “Meu Senhor Deus, que me darás? Continuo sem filhos...” Há
vinte e cinco anos Abrão esperava o cumprimento da promessa o Senhor... O tempo
estava passando, nosso pai tinha já quase cem anos... Como ainda esperar um
filho? Como crer em algo assim? Por que Deus tardava tanto em cumprir o que
prometera?
Deus, então, tira o
velho e cansado Abrão de sua tenda e de si próprio e mostra-lhe a amplidão do
céu qualhado de estrelas: “Assim será tua descendência!”
A promessa é tão
grande, mas a realidade é tão mesquinha e opaca: Abrão tem quase 100 anos, Sara
é já muito idosa e estéril e, ao fim das contas, de promessa em promessa, Deus
não cumprira nada até então... “Senhor, como saberei que vou ter tudo isto?”
Deus resolve, então
fazer um pacto com nosso Pai, cortar com ele uma aliança, como se dizia no
Oriente Médio de 4000 anos atrás. Abrão traz alguns animais, mata-os e parte-os
ao meio. Para o contrato-aliança valer é necessário que as duas partes
contratantes passem pelo meio das vítimas, como que augurando que tenham a
mesma sorte de morte se não cumprirem o contrato...
Abrão espera... Vêm
as aves de rapina, vem a escuridão, vem o cansaço, vem o terror de tristeza...
E o Senhor não vem... O Senhor demora... O Senhor tarda e parece não ver a
angústia do nosso Pai na fé.
- Por que, Senhor,
és sempre assim, tão fugidio?
Por que Teus modos e
Teus tempos são tão diferentes dos nossos?
És um Deus difícil,
Senhor!
Ajuda-me a esperar
por Ti, sustenta minha pobre fé, não deixe que se apague nunca a tênue lâmpada
da minha esperança!
Mas, quando Abrão já
está no limite, Deus irrompe no meio da noite, como uma tocha fumegante e,
sozinho, passa pelo meio das vítimas, comprometendo-Se para sempre com nosso
Pai na fé.
Que mistério! Também
Abrão, sem saber e por antecipação, teve que participar da cruz do Senhor
Jesus! Sim! Tudo na vida do crente, seja no Novo que no Antigo Testamento, é
misteriosa participação na cruz do Senhor! Nele tudo encontra seu sentido
último diante de Deus!
Difícil, para Abrão,
não foi tanto deixar a casa paterna, a segurança do clã, a cultura e a paisagem
de origem... Difícil mesmo foi ir se deixando, amoldando-se a Deus,
esvaziando-se de si e permitindo que o Senhor o educasse! “Eu sou o Senhor teu
Deus que te educo para o teu bem!”
Aqui também aparece
o sentido da Quaresma: um período de educação que nos faz aprender a
compreender os modos de Deus e a deixarmo-nos plasmar por Ele! Se
perseverarmos, se confiarmos, veremos a luz pascal, como nosso Pai que, no meio
da noite, experimentou a fidelidade do Senhor, luminosa como uma tocha
ardente...
Como vai sua
confiança no Senhor Deus?
Você tem sabido
suportar as demoras de Deus?
Pense nos momentos
de noite na sua vida? Como você age nessas ocasiões?
Reze o Salmo 138/139
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