Dom Fernando
Arêas Rifan
Bispo da
Administração Apostólica Pessoal São João Maria Vianney
O lema da Campanha da Fraternidade
desse ano – “Eu vim para servir” - foi tirado do discurso de Jesus sobre o modo
de mandar, liderar e chefiar que ele desejava fosse adotado na sua Igreja:
“Sabeis que os que são considerados chefes das nações as dominam e os seus
grandes fazem sentir seu poder. Entre vós não deve ser assim. Quem quiser ser o
maior entre vós seja aquele que vos serve, e quem quiser ser o primeiro entre
vós seja o escravo de todos. Pois o Filho do Homem não veio para ser servido,
mas para servir e dar a vida em resgate por muitos” (Mc 10, 42-45).
Jesus não está negando o poder que deve
haver na hierarquia da sua Igreja, mas explicando o modo de exercê-lo. A modo
de serviço. Servir, em latim, é “ministrare”. Daí vem a palavra “ministro”,
aquele que serve. O sacerdote é ministro, servidor dos fiéis, o Bispo, ministro
para os seus sacerdotes, isto é, servidor, e o Papa, desde tempos imemoriais,
assina “servus servorum Dei”, servo dos servos de Deus. E Jesus nos deu o
exemplo: “Sendo Deus por natureza, não se apegou ao ser igual a Deus, mas despojou-se,
assumindo a forma de escravo” (Fl 2, 6-7). E São Paulo pede que tenhamos esse
mesmo sentir e pensar.
Concomitante com a ambição do poder,
existe a ambição de possuir. Infelizmente, nos ambientes religiosos, tem sido
cultivada a teologia da prosperidade, que propaga a falsa ideia de que ser rico
e próspero é ser abençoado por Deus, ser pobre é ser por ele amaldiçoado. A
prosperidade é apresentada como prova de fidelidade a Deus. A Fé se torna um
instrumento para se obter saúde, riqueza, sucesso e poder terrenos. Os males,
as doenças a pobreza são produtos do Diabo. Deturpando, pois, o sentido
verdadeiramente evangélico, essa teologia da prosperidade cultiva o
individualismo e o interesse próprio, o oposto do verdadeiro cristianismo.
Erradamente, reforçam sua tese dizendo
que temos que viver como “filhos do Rei”, isto é, na prosperidade material.
Transforma-se assim a religião em puro materialismo, falsamente baseado na
Sagrada Escritura. É claro que não faltam citações que corroborem essa tese,
mas todas do Antigo Testamento, não do Novo, que é a plenitude da Revelação.
Jesus, o verdadeiro filho do Rei, Rei ele
mesmo, veio “para servir”. Nasceu pobrezinho numa manjedoura em Belém, viveu
humilde e pobre em Nazaré, numa família simples. Na sua vida pública, viveu sem
bens materiais: “As raposas têm tocas e os pássaros do céu têm ninhos; mas o
Filho do Homem não tem onde repousar a cabeça” (Mt 8, 20). “Não podeis servir a
Deus e ao dinheiro” (Mt 6, 24). “Em verdade vos digo, dificilmente um rico
entrará no Reino dos Céus. E digo ainda: é mais fácil um camelo passar pelo
buraco de uma agulha, do que um rico entrar no Reino de Deus” (Mt 19, 20).
Não é condenável possuir riquezas, desde
que honestamente. O direito de
propriedade é defendido por lei divina (7º Mandamento). Mas “sobre toda
propriedade particular pesa sempre uma hipoteca social, para que os bens sirvam
ao destino geral que Deus lhes deu” (São João Paulo II, 29-1-1979), ou seja, se
se tem dinheiro é preciso usá-lo para o bem do próximo e da sociedade. O que é reprovável é a desenfreada busca do
dinheiro e a ambição de ficar rico. “A raiz de todos os males é o amor ao
dinheiro. Por se terem entregue a ele, alguns se desviaram da fé e se afligem
com inúmeros sofrimentos” (1Tm 6, 10). E, pior, querer usar da religião como
meio de se enriquecer e prosperar.
É uma visão, portanto, deturpada do
cristianismo a teologia da prosperidade, com sua visão individualista e
materialista, instrumentalizando a religião para benefício material próprio. O
resumo da mensagem cristã é: “Não temos aqui cidade permanente, mas estamos à
procura daquela está para vir” (Hb 13, 14).
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