Por Emanuel Jr.
Conceber
o direito a propriedade sem entender profundamente o que vem a ser direito
natural, é como tentar entender o universo através de jornais televisivos, a
confusão é total e inerente.
O início
do número 5 da Encíclica Rerum Novarum
aborda o tema com clareza, contudo é preciso que certos conceitos estejam muito
bem delineados e suas fronteiras precisam estar em perfeita consonância com o
que se fala e se entende, caso contrário vai ser como entender o mundo através
do jornal televisivo.
Marx,
em seus devaneios sobre a propriedade, gostava de dizer que se o direito
natural sobre a terra existe é porque iniciou-se em algum momento e que esse
momento foi o instante da conquista dessa terra. Se o direito natural pertence
à humanidade, como de fato pertence, seria apenas uma questão de tempo para que
os que ficaram sem esse direito natural reconquistassem esse direito. A forma
de reconquista? A força.
Como
humanitário que Marx era (se achava assim), obviamente que entendeu que a força
não seria o melhor meio, portanto alguma outra forma deveria existir. A forma
encontrada por ele é que ninguém deveria lutar por terra alguma, o direito
natural de propriedade não existe e o Estado deve tomar conta de tudo para
prover da melhor forma tudo e todos. Em rasas palavras é essa a bela tese de
Karl Marx enfocando o direito natural à propriedade privada.
Parece
ter ficado claro que Marx não entendeu absolutamente nada de direito natural ou
deturpou seu aprendizado.
O
direito natural não é conquistado como se conquista uma trincheira em uma
guerra. O direito natural é como o nome diz: natural. Ele está fundado na
natureza a que se dedica. Para que não só minhas palavras ressoem nesse
sentido, vejamos o que é mencionado em outros livros, dicionários e autores:
“O conceito de direito natural traduz-se na existência
de um direito fundado na natureza das coisas e, em último tempo, na vontade
divina, no direito justo, denominando-se por concessão jusnaturalista (do
jusnaturalismo).”
(INFOPEDIA, acessado em 24/04/2014, http://www.infopedia.pt/$direito-natural;jsessionid=-BS1yf83O6ZWudLpL+gupg__)
Obviamente
que a natureza divina nesse contexto marxista não existe, o que faz confundir
ainda mais a cabeça dos adeptos e coaduna ainda mais a posição da Igreja de que
não é possível ser marxista e católico (religioso) ao mesmo tempo, são posições
paradoxais.
Direito natural é a ideia abstrata do Direito, o
ordenamento ideal, correspondente a uma justiça superior e anterior – a chamada
norma jurídica hipotética e fundamental
(Teoria Geral do Estado - Hans Kelsen)
Os
conceitos de direito natural sempre vão terminar se deparando com a origem
divina. Tanto em Kelsen quanto em Aristóteles, Cícero ou qualquer pensador
sério, o conceito se deparará com sua origem: Deus. Por esse fato é tão difícil
ser entendido dentro de Estados socialistas ou com tendências a esse sistema.
Deus não pode fazer parte do socialismo porque destruiria as bases do sistema.
O sistema socialista/comunista, portanto, é fundado em conceitos contrários ao
Direito Natural. Abaixo veremos mais um conceito assim delineado:
Direito natural é o que emana da própria natureza, independente
da natureza do homem (Cicero). É invariável no espaço e no tempo, insuscetível
de variação pelas opiniões individuais ou pela vontade do Estado (Aristóteles).Ele
reflete a natureza como foi criada. É anterior e superior ao Estado , portanto,
conceituado como de origem divina.
(TEORIA GERAL DO ESTADO- Maluf, Sahid. pag 23)
É
por esses motivos que o Papa Leão XIII em sua encíclica Rerum Novarum, começa o número 5 da referida encíclica, afirmando
que o remédio que o socialismo propões está em confronto com o direito natural:
5. (...) o remédio proposto está em oposição flagrante
com a justiça, porque a propriedade particular e pessoal é, para o homem, de
direito natural.
Não
se trata de algo de altíssimo grau intelectual e, portanto, de difícil alcance,
entender que devemos praticar o bem e evitar o mal. Nossos pais, muitas vezes
sem entender isso, nos ensinaram assim. Os pais deles, nossos avós, já foram
ensinados assim. Provavelmente a maioria deles sequer tem noção do que é
direito natural, contudo a prática é comum justamente por ser natural. Ele é
inerente ao ser humano que já nasce com essa lei natural inscrita em sua mente,
em sua alma.
O
direito de propriedade decorre dessa mesma lei natural que nos impulsiona a lutar
pela própria vida e a não fazer aos demais o que não queremos que façam conosco
(Tb 4, 16). Essa máxima é bíblica, contudo somente reflete o que está no homem
desde que esse existe. A Bíblia apenas refletiu o que já existia.
A
propriedade privada é de direito natural pelo simples fato de que é a expressão
da pessoa humana. É fruto do seu trabalho ou do de seus antepassados. É o
espelho do indivíduo, que precisa de um aconchego preservado pela privacidade,
onde pode ser ele mesmo, cercado dos sinais que identificam o seu eu. Ela
estimula o trabalho, sendo o homem atraído espontaneamente pela perspectiva da
recompensa direta e pessoal de seus esforços. E isso de importância extrema.
Mais
ainda que isso, a propriedade é a lógica de uma sociedade articulada e
organizada, ao contrário da meramente coletiva que é pregada por socialistas de
todas as correntes, que tem por consequência uma sociedade massificada, sem
diversificação nem liberdade.
Defendendo
a propriedade privada como faz a Igreja e como todo Católico Apostólico Romano
deve fazer, estamos defendendo a liberdade individual em contraposição à
massificação social pela cultura, costumes, atitudes e omissões, reações,
palavras e dons pessoais.
“A propriedade faz parte da natureza do homem e da
natureza das coisas. Como o trabalho, ela encerra um mistério – é a projeção da
personalidade humana sobre as coisas. A pessoa tende à propriedade por um
impulso instintivo, do mesmo modo que a nossa natureza animal tende ao
alimento. O apetite da propriedade é tão natural à nossa espécie como a fome e
a sede; apenas é de notar que estes são apetites da nossa natureza inferior, ao
passo que aquele procede da nossa natureza superior. Todo o homem tem alma de
proprietário, mesmo os que se julgam seus inimigos. É isto que se entende
quando se afirma que a propriedade decorre do direito natural” (R.G. Renard,
L’Église et la Question Sociale, p. 137 et seq.).
Em
igual prisma, a propriedade faz parte da dignidade da pessoa humana e está
intimamente ligada a essa dignidade. Senhor dos seus atos, para agir com toda a
independência, o homem tem necessidade de poder apropriar-se exclusivamente de
certos bens, para orientar sua atividade segundo suas aspirações e seus gostos
e trabalhar, sem coação, no desenvolvimento de sua personalidade.
Enfim,
entendendo a propriedade privada como algo inerente ao ser humano e não como
algo que deve ser conquistado, como pensava Marx, temos a propriedade como
direito natural e não como conquista pessoal que deve ser violenta ou
intelectualmente retirado de outrem. Todos temos inclinação a proprietários e
sob essa base é concebida a Encíclica Rerum
Novarum.
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