Por Denilson
Cardoso de Araújo
Em 1998, vendo no
que ia dar, me afastei do PT. Interessa aqui a minha frase de então. Não quero
ser refém do Lula. Não sou. Ao contrário de tantos que seguem reféns,
defendendo o indefensável, quando escrevo sobre a derrocada do sonho, é
tranquilo que o faço. Ser refém é ruim. Conheço famílias reféns. De filhos
pródigos, porque não agiram a tempo de evitar o desabamento no vício e na
ilicitude. E reféns de abusadores de liberdades, pois permitiram o intolerável.
Doutrinador da tolerância, Stuart Mill ensinou que só deve ser permitida
publicamente a prática daquilo que pode ser incentivado a todos. Pode ser
estimulado o abuso?
Pode um ocidental,
frente à principal mesquita de um país islâmico, onde a mera reprodução
pictórica de Maomé é vedada, fazer chacota com o fundador do Islã? E, na piada,
exibir o profeta em cartum da Charlie Hebdo: nu, de quatro e com uma estrela no
ânus sob jocosa inscrição “Nasce uma estrela”? A livre expressão pode tudo?
Não.
Empresário em missão
estrangeira sabe. Calará sobre costumes estranhos, sob pena de fracasso dos
negócios. Missionários e antropólogos, em respeito aos valores dos povos que
vão converter e estudar, nem sempre dirão o que pensam. Embaixadores, acatando
a diversidade dos países em que atuam, deverão engolir sapos. Até o turista
deverá silêncio quando discordar de tradições dos países que visita.
A globalização fez
do planeta grande praça à frente de toda igreja, casa e mesquita. Discursos e
caricaturas são conhecidos ao toque do instante. O que exige maior cuidado. Da
imigração, países europeus são, hoje, também muçulmanos. A leviandade de se
permitir agressões a símbolos cristãos, não obriga a que todo mundo leve na boa
o achincalhe da fé que cultivam. Claro que não se pode justificar estuprador
porque a moça usava short cavado. Mas prudente será que, em surtos de estupro,
moças de shorts cavados evitem certos lugares. Cautela do bom senso.
Muitos, que não
observam cautelas, são hoje reféns da frase oportunista: Je suis Charlie. Feita
para condenar o terror, dá apoio à revista. Estou fora. Não sou Al Qaeda, não
sou Charlie. Nem acho lícito que o esforço de todos sustente o abuso de alguns.
Garantir, à custa do Erário, que sigam desenhando Deus Pai, Cristo e o Espírito
Santo se sodomizando, em vilipendiosa brincadeira, me parece contrassenso.
Custear policiais como guarda pessoal de tal minoria boêmia pode roubar dos
miseráveis sem champanhe e sem direitos de expressão, mais dos serviços, saúde
e educação que lhes faltam.
Em nome da livre
manifestação, na passagem do Papa no Rio, militantes gays e abortistas
reproduziram masturbação com o crucifixo. Que, vale lembrar, um dia foi cena da
menina possuída pelo demônio, no filme O Exorcista. Algo não vai bem quando
esse abuso ocorre onde já se estabeleceu que o direito de livre expressão não é
absoluto. O Brasil proíbe a propaganda nazista e a divulgação de certos
discursos a plateias infantis, impondo classificação etária de produtos
culturais. O chute na santa é vedado porque o que para uns é só estátua pode
ser o sagrado de outro. Para muitos, o crucifixo é símbolo sagrado.
A França está
ficando tão refém do seu discurso de liberdade de expressão radical, quanto os
Estados Unidos, de seu discurso de liberdade de portar armas. Quando massacres
acontecem nas escolas de um e nas redações de outro, parece uma ingenuidade não
revisar tais conceitos.
A liberdade de
expressão é boa herança, mas seu abuso, absolutamente, não. O Charlie Hebdo
opera uma pedagogia do escândalo e do bullying. Que não seja modelo. Quem
conhece a guerra do dia a dia em nossas escolas sabe do que estou falando.
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