quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

O vento é encantado.

Por Evelyn Mayer

Quando eu era criança, minha avó contava muitas histórias. Lobisomem, saci pererê, mula sem-cabeça... Mas, hei! Não eram invenções, não. Nem fábulas. Eram histórias reais (rs!). Sim, ela dizia que tinha visto, que o pai tinha visto, o primo da mãe... Teve até um cunhado da minha bisavó que era lobisomem e veio pedir sal à sua mulher...

Segundo ela mesma conta, naquela época cria-se em tudo. "A gente era tonto. Não tinha televisão", diz. Acho que ela se enganou.

Se enganou, porque o fato de termos televisão não nos faz mais inteligentes. Talvez nos faça mais tontos que eles. E não gosto de defini-los. Eram o que eram. Eram trabalhadores que se sustentavam com o que plantavam, eram cristãos que acreditavam piamente na providência divina, eram atores, cantores... eram o que eram.

Eu ouvia as histórias e imaginava os personagens. Como eram? O que faziam? As feições... tudo passava pela minha cabecinha inocente. Era divertido. Todo dia tinha uma história. Coisas que hoje não vemos mais, não é mesmo? Ninguém tem tempo para uma história, mesmo que 'tonta'.

Foi a minha avó quem foi, aos poucos, estimulando minha criatividade. Depois dela, minha mãe, com os livros que comprava. Sempre tinha um numa data especial. E eu os amava! Lia, lia, lia! Era meu maior divertimento depois das histórias da minha avó.

Hoje, minha avó está caduca. Dizem que é Alzeimer. Ainda não foi diagnosticado, mas os traços dão o sinal. Porém, há algumas coisas que ela nunca esquece. Uma delas são as histórias. Sempre se lembra de contar um "causo". Se nos sentamos, ela fala: "Ah, se mamãe visse uma cena dessa, já corria contar uma história. Sabe que ela teve um cunhado que era lobisomem..." Não somente as histórias, ela também me dá conselhos. E tantos bons conselhos.

Entretanto, há uma coisa que ela sempre fala que me deixa intrigada. Bateu um ventinho, e ela fala: "O vento é encantado. A gente não o vê, mas sente".

O vento é encantado.
Eu acho tão bela esta expressão! O vento é encantado! E por que não? Os encantos do Senhor são tantos... É realmente bonito - e porque não, lúdico! - essa definição para o vento... Tá, eu sei que há todas as explicações científicas para ele, mas eu quero me ater ao lúdico. Chamar o vento de encantado, pra mim, é acreditar na poesia, no mistério, naquilo que não vejo, mas sinto. Isto é encantador. Tem encanto. É encantado.

Conforme o dicionário, o significado da palavra encantado é "efeito sobrenatural dos supostos poderes mágicos". Deus é mágico. Criou tudo sem ter nada, a não ser a Sua Onipotência. Criou algo tão simples e que nos encanta: o vento. Deus nos toca tal qual o vento. A gente não o vê, mas Ele nos toca e nos encanta. Deus é encantado.

Quando partimos para a literatura, vemos que outros encantos para a inteligência Deus nos deu. Um deles é trabalhar o imaginário de quem lê. Tudo o que há lá é regado de encanto. Transforma-nos nas aventuras que só vivemos lá.


Ficar com esta definição do vento que a minha avó acredita é, para mim, perfeita. Quando eles (Deus e o vento) me tocarem, eu sempre sentirei seus encantos, cada qual em seu lugar hierárquico...

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