Por Evelyn Mayer
Quando eu era criança, minha avó contava muitas histórias. Lobisomem,
saci pererê, mula sem-cabeça... Mas, hei! Não eram invenções, não. Nem fábulas.
Eram histórias reais (rs!). Sim, ela dizia que tinha visto, que o pai tinha
visto, o primo da mãe... Teve até um cunhado da minha bisavó que era lobisomem
e veio pedir sal à sua mulher...
Segundo ela mesma conta, naquela época cria-se em tudo. "A gente
era tonto. Não tinha televisão", diz. Acho que ela se enganou.
Se enganou, porque o fato de termos televisão não nos faz mais
inteligentes. Talvez nos faça mais tontos que eles. E não gosto de defini-los.
Eram o que eram. Eram trabalhadores que se sustentavam com o que plantavam,
eram cristãos que acreditavam piamente na providência divina, eram atores,
cantores... eram o que eram.
Eu ouvia as histórias e imaginava os personagens. Como eram? O que
faziam? As feições... tudo passava pela minha cabecinha inocente. Era divertido.
Todo dia tinha uma história. Coisas que hoje não vemos mais, não é mesmo?
Ninguém tem tempo para uma história, mesmo que 'tonta'.
Foi a minha avó quem foi, aos poucos, estimulando minha criatividade.
Depois dela, minha mãe, com os livros que comprava. Sempre tinha um numa data
especial. E eu os amava! Lia, lia, lia! Era meu maior divertimento depois das
histórias da minha avó.
Hoje, minha avó está caduca. Dizem que é Alzeimer. Ainda não foi
diagnosticado, mas os traços dão o sinal. Porém, há algumas coisas que ela
nunca esquece. Uma delas são as histórias. Sempre se lembra de contar um
"causo". Se nos sentamos, ela fala: "Ah, se mamãe visse uma cena
dessa, já corria contar uma história. Sabe que ela teve um cunhado que era
lobisomem..." Não somente as histórias, ela também me dá conselhos. E
tantos bons conselhos.
Entretanto, há uma coisa que ela sempre fala que me deixa intrigada.
Bateu um ventinho, e ela fala: "O vento é encantado. A gente não o vê, mas
sente".
O vento é encantado. |
Eu acho tão bela esta expressão! O vento é encantado! E por que não? Os
encantos do Senhor são tantos... É realmente bonito - e porque não, lúdico! -
essa definição para o vento... Tá, eu sei que há todas as explicações
científicas para ele, mas eu quero me ater ao lúdico. Chamar o vento de
encantado, pra mim, é acreditar na poesia, no mistério, naquilo que não vejo,
mas sinto. Isto é encantador. Tem encanto. É encantado.
Conforme o dicionário, o significado da palavra encantado é
"efeito sobrenatural dos supostos poderes mágicos". Deus é mágico.
Criou tudo sem ter nada, a não ser a Sua Onipotência. Criou algo tão simples e
que nos encanta: o vento. Deus nos toca tal qual o vento. A gente não o vê, mas
Ele nos toca e nos encanta. Deus é encantado.
Quando partimos para a literatura, vemos que outros encantos para a
inteligência Deus nos deu. Um deles é trabalhar o imaginário de quem lê. Tudo o
que há lá é regado de encanto. Transforma-nos nas aventuras que só vivemos lá.
Ficar com esta definição do vento que a minha avó acredita é, para mim,
perfeita. Quando eles (Deus e o vento) me tocarem, eu sempre sentirei seus
encantos, cada qual em seu lugar hierárquico...
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