Por Paulo
Henrique Cremoneze.
ECUMENISMO (OU O
DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO) NÃO É A MESMA COISA QUE SINCRETISMO: Ecumenismo e
diálogo inter-religioso, SIM; Sincretismo e universalismo, NÃO, jamais!
Ecumenismo não é a
mesma coisa que sincretismo. Aquele é algo bom e necessário, algo que não fere
a identidade de fé de cada pessoa que se dispõe a experimentá-lo, ao passo que
o sincretismo é perigoso, para não dizer essencialmente ruim, não produz nada
que possa ser aproveitado para a maior glória de Deus. Confesso que
não gosto do sincretismo religioso, pois isso significa perda de identidade,
mas sou um entusiasta dos diálogos ecumênico (entre profissões de fé cristãs) e
inter-religioso (entre uma profissão de fé cristã e outra não-cristã).
Não sou partidário
do sincretismo porque vejo nele o perigo de se construir uma fé de
conveniência, manietada e esvaziada de conteúdo (aliás, o grande projeto dos
inimigos de Deus e das religiões). Costumo dizer que quem acredita em tudo, no
fundo, não acredita em nada. O princípio da identidade é taxativo: o que é, é.
Logo, o sincretismo tudo mistura e nada concreto apresenta.
Sou partidário do
diálogo ecumênico porque Jesus é um só para católicos, ortodoxos e
protestantes, razão pela qual devemos, senão nos amar, ao menos nos suportar
dignamente por causa de Jesus, caminho, verdade e vida. (e não é a tolerância
em si mesmo um ato de amor?).
Penso, seguindo
conselho do amado Papa Bento XVI, que mais importante do que os problemas
históricos e as diferenças doutrinárias, os cristãos têm o dever de mostrar ao
mundo a cruz e a luz de Cristo. E ao se falar em unidade, em ecumenismo,
fala-se, na esteira do que o Santo Padre afirmou em testemunho comum, não em
imposição de uma forma de viver à fé à outra. Exatamente o que diz o Relatório
sobre a quarta fase (1990-1997) do Diálogo internacional entre a Igreja
católica romana e as Igrejas pentecostais tradicionais, bem como outros
pentecostais, emitido pelo Conselho Pontifício para a promoção da unidade dos
cristãos: “O objetivo não é a unidade estrutural, mas antes a promoção
do respeito e da compreensão mútua entre a Igreja católica e os grupos do
pentecostalismo tradicional”.
O diálogo ecumênico
abranda o escândalo que é os incréus estarem mais a par do que divide as
Igrejas do que aquilo que as une, aproveitando-se disso para afastar a presença
de Deus no mundo. Além disso, o diálogo ecumênico possibilita a conscientização
da tristeza que é um testemunho dividido.
Um mundo que vive à
sombra da ditadura do relativismo moral e que na sua porção ocidental se
esforça em negar as próprias tradições e raízes, provocando a erosão de sua
identidade, a morte dos valores morais judaico-cristãos responsáveis pelo seu
desenvolvimento, mais do que nunca a unidade urge, pois é preciso não se
permitir a retirada da experiência de Deus no espaço social, confundindo-se os
benefícios do Estado laico, com os malefícios de um Estado laicista, um Estado
absolutista e ateu ou uma sociedade marcada pelo hedonismo desenfreado, cuja
simples menção da palavra Deus é uma ofensa profunda, porque dignifica o dique
de contenção moral que ela não quer.
Minha identidade
fortemente católica não me afasta, mas, ao contrário, me aproxima dos irmãos de
fé ortodoxos e protestantes, pois se existem muitas Igrejas cristãs hoje
certamente há um propósito de Deus maior para isso, um propósito tão elevado e
profundo que sequer ouso me alongar refletindo a respeito. O tempo das
acusações recíprocas já passou (ou, ao menos, deveria ter passado para a maior
parte dos cristãos) e o tempo das discussões estéreis também. Agora, é o tempo
de união, de todos os cristãos colocarem as vaidades de lado e comungarem de um
mesmo objetivo: inserir a cruz de Cristo no mundo.
As almas gritam por
salvação, as pessoas perdem-se em manifestações difusas, pseudo-espirituais,
retomam os caminhos do um panteísmo redesenhado e absorvem conceitos errados de
fé, desprezando a Bíblia, deixando de lado o Senhor. Os cristãos têm culpa em
parte nisso. Perdidos em suas disputas fratricidas deixam de dar ao mundo bons
exemplos e cedem espaços para os lobos em pelo de cordeiros profetizados pelo
Senhor. Durante muito tempo, católicos e protestantes viram-se uns como lobos
dos outros e deixaram seus rebanhos para os oportunistas, os verdadeiros
salteadores, os verdadeiros lobos.
É o tempo de reunir
os rebanhos, de proteger os fiéis, de caçar os lobos ferozes e que só querem o
mal. É chegado o tempo de o mundo voltar a se encantar com a pureza da fé da
Igreja primitiva e reconhecer que não existe beleza maior do que a de Cristo
Jesus.
Hoje, muito se fala,
mas nada se conhece de espiritualidade, de mística. Ora, quem lê os escritos
dos Padres da Igreja dos primeiros séculos, elaborados a partir de uma visão
essencialmente espiritual da Bíblia, embriaga-se com a profundidade mística de
cada texto e enxergar uma beleza sem precedentes na fé cristã.
Essa beleza
decantada por muitos mestres espirituais católicos e, nos últimos quinhentos
anos, também protestantes, sem se deixar de lado os irmãos cristãos ortodoxos,
todos os cristãos devem apresentar ao mundo: a invulgar e oceânica profundidade
da fé cristã. E tudo isso com um propósito eminentemente prático, voltado às
lutas diárias e ao trabalho cotidiano. Tanto a Igreja Católica como as Igrejas
Protestantes acreditam na santificação da vida por meio do trabalho.
Sobre o ecumenismo,
o Papa Bento XVI disse no dia 2 de março de 2006, por ocasião do “Encontro com
o clero da diocese de Roma”: “Isto é de grande importância: devemos
suportar a separação que existe. São Paulo afirma que os cismas são necessários
durante certo tempo e o Senhor sabe bem porquê: para nos por à prova, para nos
exercitar, para nos fazer amadurecer, para nos tornar mais humildes. Mas ao
mesmo tempo somos obrigados a caminhar no sentido da unidade e caminhar rumo à
unidade é já uma forma de unidade”.
De fato, o desejo de
compreender o outro e procurar mais o que nos aproxima do que o aquilo que nos
separa é forma de unidade, é mostrar ao mundo o espírito cristão. Afinal, como
falar de Jesus Cristo e Seu amor redentor se aqueles que se dizem cristãos não
conseguem suportar uns aos outros, enxergando mais as diferenças históricas e
doutrinárias do que aquilo que é mais importante, aquilo que é fundamental, a
pessoa de Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro homem?
Acaso, podemos
ignorar as palavras do Senhor: “Porque quem não é contra nós é por nós”
(Mc 9, 40)? Não, não podemos e não devemos. Quem verdadeiramente se deixa
infundir do Espírito Santo, quem confessa no nome de Jesus como O Senhor, O
“Kyrios”, O “Pantokrator” (Senhor da vida, Senhor de tudo, Rei do Universo),
não é contra outro que também confessa a mesma verdade, ainda que por meio de
outra profissão de fé.
O ecumenismo não
significa rejeitar as convicções herdadas de uma determinada profissão de fé,
tampouco acutilar a própria identidade, mas abrir-se sinceramente ao outro e
concentrar-se apenas na pessoa de Jesus. As demais questões podem e devem ser
tratadas, mas num segundo momento. O primeiro é e sempre deverá ser a pessoa de
Jesus, aquilo que une os cristãos em todo o mundo, católicos, ortodoxos e protestantes.
Aquilo que une os autores deste livro, um católico, outro protestantes, os
dois, cristãos.
Não, pelo contrário,
significa a unidade de testemunho e a comunhão de elementos essenciais,
respeitando-se a estrutura de cada profissão de fé. O objetivo do ecumenismo
não é a unidade estrutural ou a adesão à Igreja católica romana, restaurando-se
a unidade primitiva do primeiro milênio e que resultou na quase formação de um
Estado supranacional cristão, o chamado Sacro Império Romano-Germânico, em que
toda a cristandade estaria abraçada numa só identidade, credo, nação. Não, a
unidade é antes de tudo espiritual. Com efeito, disse oficialmente o Conselho
Pontifício para a Promoção da Unidade dos Cristãos: “Os pentecostais e os
católicos têm a mesma preocupação de unidade da Igreja. O objetivo preciso
destas discussões é desenvolver um clima de respeito mútuo e de compreensão
quanto à fé e à prática, de encontrar pontos de acordo autêntico, bem como
indicar os âmbitos nos quais convém prosseguir o diálogo”. (Diálogo
católico-pentecostal: evangelização, proselitismo e testemunho comum).
Muito se fala sobre
o ecumenismo, mas pouco realmente dele se conhece. Não raro, o ecumenismo é
distorcido e confundido com sincretismo. Sabemos o verdadeiro significado do
ecumenismo: o diálogo fraterno e compreensivo entre as diferentes profissões de
fé cristã. E acrescentamos, sem perdas de identidades. Assim como valorizamos o
ecumenismo, corretamente compreendido e vivido, conferimos invulgar importância
ao diálogo inter-religioso, isto é, o diálogo entre os cristãos e os
partidários de outras profissões de fé, especialmente os mulçumanos (os quais
constituem, hoje, a maior religião do mundo em termos de fiéis) e o judeus (e
com especial carinho, pois além do judaísmo ser a religião da qual as demais
religiões monoteístas nasceram, os judeus são, segundo palavras do Papa João
Paulo II, hoje beato, os irmãos mais velhos dos cristãos na fé).
Sabemos todos,
também, que existem diferenças significativas entre as visões de fé dos católicos
e protestantes, mas procuramos, sem ignorar as diferenças, aquilo que nos
une. E o que nos une? O amor por Jesus Cristo, verdadeiro Deus e
verdadeiro homem. Nosso desejo, sem enveredar pelo proselitismo religioso, é
levar ao mundo a beleza da cruz e da luz de Nosso Senhor Jesus Cristo. E ao
fazermos, seguimos a vontade do próprio Jesus.
Por isso acredito
que o diálogo ecumênico é o caminho para nós, cristãos em geral, diminuirmos os
efeitos negativos de uma cultura anti-religiosa que se espalha no mundo
contemporâneo como veneno.
A visão ecumênica é
a resposta ao anseio de nossas almas e o carinho que a amizade gera, de tal
forma que um não se preocupou em mostrar a sua fé ao outro, mas os dois,
conscientes das diferenças, buscaram a unidade, em nome de um mesmo e
verdadeiro amor.
Mais uma vez, invoco
o Relatório sobre a quarta fase (1990-1997) do Diálogo internacional entre a
Igreja católica romana e as Igrejas pentecostais tradicionais, bem como outros
pentecostais, emitido pelo Conselho Pontifício para a promoção da unidade dos
cristãos: “Sensíveis ao problema do testemunho dividido, os participantes
deste Diálogo compartilham o sofrimento que sentem diante dessa situação.
Sofrimento este que moveu sobretudo a buscar meios de superar as divisões, em
conformidade com a exortação paulina “a guardar a unidade do Espírito pelo
vínculo da paz” (Ef 4,3)”.
O mundo, hoje mais
do que nunca, é contaminado pelo o que se pode chamar de ditadura do
relativismo moral. E essa mesma “cultura” tem por objetivo fundamental banir a
presença de Deus no mundo, ferindo o que é substancial para o equilíbrio da
vida: os valores morais judaico-cristãos. Por isso, o diálogo ecumênico precisa
ser incentivado e exercido com base nas virtudes teologais da fé, esperança e
caridade.
Nesse sentido,
lembro mais uma vez o discurso que o Papa Bento XVI proferiu num encontro
ecumênico profundamente rico e imantado de simbolismo. O Papa, ao visitar
apostolicamente sua terra natal, a Alemanha, escolheu o mosteiro agostiniano em
que Martinho Lutero, pai da reforma protestante, estudou para transmitir aos
líderes religiosos católicos, ortodoxos e protestantes (luteranos,
presbiterianos, metodistas e outros) presentes a importância de os cristãos
unirem forças, deixando de lado as diferenças doutrinárias, teológicas e
históricas de lado, em prol da defesa dos valores cristãos e com vistas a
exibirem ao mundo a pessoa de Jesus Cristo.
A nova evangelização
passa necessariamente pelo caminho de união e fraternidade entre os cristãos.
Acredito, ao menos assim espero em Deus, fazer nossa parte dos esforços para
toda a Cristandade pensar a unidade ainda que sob bandeiras d fé distintas e a
partir dela a integração saudável com as profissões de fé não cristãs.
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