Por Emanuel
Jr
Contemplação: solidão e melancolia. |
No
cristianismo vários paradoxos podem ser encontrados. Podemos pensar desde o
mais básicos até o mais complexos. Os exemplos multiplicam-se. Desde que há
alguém falando em cristianismo como modo alegre e sorridente de se viver, algo
muito cogente no governo de nosso Papa Francisco, ao mesmo tempo temos o
cristianismo que diz que acima de tudo isso está a contemplação. Ah, a
contemplação! Momento único, isolado e melancólico. Eis um dos grandes
problemas: como conciliar a melancolia com a alegria. Desses paradoxos é feito
o cristianismo.
Ao
mesmo tempo em que alguém afirma que o cristianismo defende o capitalismo, a
doutrina social nos informa que não, não somos capitalistas, mas também não
somos de forma alguma socialistas, afinal esse é intrinsecamente mau. Mas e
então? Aprendi a discernir que sempre que me coloco a frente de um dilema como
esse e tantos outros que já me apareceram, basta procurar, porque em algum
momento de sua história a Igreja já terá se manifestado a respeito. Descobri
também que muitas vezes ela não se manifestou com a audácia e demonstração de
força que eu gostaria e outras vezes que se manifestou em total desacordo com o
que eu penso. Que eu me adeque nesse último caso.
A
grande questão é que dos muitos e variados paradoxos aparentes de que é feito o
cristianismo, temos um que é preferencial de muitos teólogos e santos e que
hoje se mostra ainda mais desconfortável de se falar devido a atual e crescente
onda de ateísmo. Esse paradoxo é a tribulação.
Cristo
disse claramente que:
"Bem-aventurados são os
pobres de coração, pois deles é o Reino dos céus" (Mt 5, 3)
Mas
Cristo e em todo o transcurso da Bíblia fica muito claro o que temos sobre as
esmolas:
"Dá esmola dos teus bens, e não te desvies de
nenhum pobre, pois, assim fazendo, Deus tampouco se desviará de ti. (Tobias 4,
7)
"(...)porque a esmola livra do pecado e da morte,
e preserva a alma de cair nas trevas." (Tobias 4, 11)
"A esmola será para todos os que a praticam um
motivo de grande confiança diante do Deus Altíssimo." (Tobias 4, 12)
"Meu filho, não negues
esmola ao pobre, nem dele desvies os olhos." (Eclesiástico 4, 1)
E
pra não dizer que falei só de antigo testamento, vamos ao que Novo diz a
respeito do tema:
"Assim, a tua esmola se fará em segredo; e teu
Pai, que vê o escondido, recompensar-te-á." (São Mateus 6, 4)
"Dai antes em esmola o que possuís, e todas as
coisas vos serão limpas." (São Lucas 11, 41)
A
dúvida sempre me foi muito clara: se o Reino dos céus é dos pobres, porque
raios de motivo eu devo tirar o pobre de sua pobreza. Parece-me lógico que o
tirando da pobreza eu o afasto do Reino dos céus à custa da minha aproximação. Uma
coisa deve mesmo interferir na outra ou mesmo depender da outra? Como conciliar
isso tudo? A prática da justiça social e compaixão dando esmolas e removendo a
pobreza não é lícita ou é?
Se
o sofrimento, como consta nas bem-aventuranças é tão bom, não deveria ser ele
procurado no lugar de evitado? Afinal Jesus não orou para ser poupado no
Getsêmani? Se orou para ser poupado, como pode o sofrimento levar aos céus e
como pode Deus, que é perfeito, ter tal vontade?
O
grande paradoxo aparente é que vemos o sofrimento, a tribulação, como um bem em
si mesmo ou como um mau em si mesmo. Ele não é. Ele é uma consequência ou mesmo
uma dependência. O que precisamos urgentemente entender nesse mundo que tenta
escapar do sofrimento, muitas vezes legitimamente, é que há algo positivo para
o sofredor em qualquer experiência penosa. O grande problema está sendo
identificar o que é positivo no sofrimento. Pois bem, o sofrimento e a tribulação
são positivos quando sofridos em total e absoluta submissão à vontade de Deus.
Estando submisso à vontade de Deus, nosso sofrimento é apenas um meio para a
santificação, uma prova a que devemos passar para aprender mais e mais, contudo
isso não encerra a questão. Como resolver o problema de quem é espectador desse
sofrimento? Deve continuar como espectador e ver, passivamente, a tribulação
alheia? Obviamente que não, apesar de o parente paradoxo nos remeter a isso.
Para os espectadores, o sofrimento alheio deve despertar a compaixão que, uma
vez despertada, faz com que os atos de bondade sejam levados a algum grau.
Quanto maior o grau, maior o mérito.
Assim
sendo, o sofrimento entregue diretamente a Deus, em total submissão à Sua
vontade, é meritório não pelo sofrimento em si, mas pela obediência. Cristo
sofreu por nós não porque tinha que aprender alguma coisa, mas porque tinha
total obediência ao Pai e essa era a vontade do Pai. Os sofrimentos foram
oferecidos em totalidade, contudo o sofrimento de um Deus (Cristo) obviamente é
muito mais meritório que qualquer tipo de sofrimento humano. Assim, Cristo
pagou os pecados de toda a humanidade e abriu caminho para que façamos o mesmo
com nós mesmos. Por outro lado, aquele que assiste ao sofrimento alheio precisa
estar cheio de compaixão para com o aquele sofrimento e, então, não será a
tribulação ou não tribulação do outro que o levará a ter méritos, mas a
compaixão sentida e externada dentro do máximo possível naquele momento.
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