quarta-feira, 23 de abril de 2014

Virtudes: cultivando-as para uma vida exemplar.


Por Paulo Henrique Cremoneze

Antes mesmo de terminar minhas reflexões sobre o espírito de luta, o que farei em breve com a terceira e última parte, resolvi tecer considerações sobre um outro assunto que é muito caro aos meus olhos e que tenho especial predileção: virtudes.

Inspirei-me e inspiro, para tanto, não só no tema de reflexão imediatamente precedente (o espirito de lta), mas numa conferência do querido Padre Francisco Faus, da sociedade sacerdotal da Santa Cruz.

Evidentemente que existe um viés católico no âmago destas considerações que ora compartilho, mas qualquer amigo delas poderá fazer uso, com espírito crítico, mesmo que não professem a fé católica.

As considerações não se apegam, necessariamente, a esta ou aquela virtude, mas do ideal virtuoso propriamente dito.

Vamos lá:

O homem virtuoso sente-se feliz em praticar as virtudes. Para ele, não lhe é pesado tal prática, ainda que difícil. A prática, antes de ser um fardo, é motivo de profunda alegria, pois ele sabe que nelas será fortalecido.

No plano espiritual, essa prática motivado e alegre das virtudes é perfeitamente espelhada nas primeiras linhas do SALMO 1: "Feliz que não segue o conselho dos maus, não anda pelo caminho dos pecadores, nem toma parte nas reuniões dos zombadores, mas na lei do Senhor encontra sua alegria e a medita dia e noite.".

Ora, quem se esforça para praticar as virtudes, com o corajoso espírito de luta, sente profunda alegria, pois a prática das virtudes é um das formas de se cumprir fielmente a Lei de Deus, meditando-a diurtunamente.

A meditação da Lei de Deus, num sentido amplo, corresponde aos conceitos monásticos de VACCARE DEO e MEMORIA DEI, desenvolvidos no início da Idade Média com raízes nos primódios da história da Igreja.

Quem abre em sua vida o ESPAÇO PARA DEUS (o VACCARE DEO), estará o tempo todo, ainda que em meio aos afazeres cotidianos mais triviais, vivenciando o MEMORIA DEI, pois Deus estará em todos os seus pensamentos e suas ações.

Nisso consiste a virtude práticada.

É, ao menos em tese, possível viver uma vida virtuosa despido do sentimento religioso. Todavia, a virtude praticada por aquele que não crê em Deus, será uma virtude menos perfeita, uma vez que desabrigada do manto sobrenatural.

A virtude será meramente uma prática voltada aos olhos humanos e não dirigida à glória de Deus.

Evidentemente que terá seu valor, inestimável, de sublinhar, mas não será tão perfeita, tão altiva, tão essencialmente virtuosa, com o perdão do trocadilho, quanto aquela que preaticada por amor de Deus e para a glória de Deus.

A prática das virtudes reclama uma constante evolução. Nunca o homem que busca a vida virtuosa deve se mostrar satisfeito, pois é sempre possível crescer no campo das virtudes. Trata-se de uma "santa ambição" a ser cultivada, plenamente orientada para a superação dos próprios limites.

Praticar constantemente as virtudes exige um poderoso binômio: MODESTIA e HUMILDADE. Não há vierude verdadeira sem modéstia e humildade. Quem, por exemplo, ejactar-se da prática de determinado ato, poderá até ter feito algo bom, mas certamente não algo santo e justo, algo efetivamente virtuoso. A prática da virtude prescinde do envaidecimento.

Exemplo: tornou-se comum a criação de entidades, ONG(s), institutos e afins para a prática de obras caridosas. Salvo raríssimas exceções, a maioria dessas entidade e desses institutos, mesmo que eventualmente praticando aparentes boas obras, apenas espelham as vaidades de seus fundadores, mais preocupados com a idolatria de seus egos e nomes do que com a prática da caridade (isso quando os tais institutos não servem de fachada para atos ilícitos ou imorais, como lavagem de dinheiro ou captação de dinheiro público com desvio de finalidade).

Ora, quem quer praticar a caridade, o faz em silêncio, com discrição. Os santos da Igreja sempre praticaram a virtude da caridade, mas com absoluta discrição, espírito contrito, piedoso e humilde.

Uma conduta só é realmente virtuosa quando dotada de irresistível altruísmo. Grosso modo, o altruísmo pode ser definido como a constante e perpétua vonyade de servir aos outros, ajudando-os na aquisição de virtudes, no cultivo do amor à prática das virtudes.

Para um homem ser verdadeiramente virtuoso, é necessário que ele dilate seu coração. Há de abrir espaço na alma para os seguintes itens: 1) amor ao sacrifício 2) amor à discrição 3) amor à abnegação 4) contentamento em fazer o bem 5) desejo de apenas contar com os olhos e o aval de Deus e 6) amor à entrega.

Somente quem se entrega plenamente, sem reservas (claro, com prudência e com temperança, com equilíbrio e com sabedoria, mas sempre sem reservas), está apto à vida virtuosa.

Os profetas do Antigo Testamento foram homens que se entregaram à vontade de Deus.

Antes deles, Abrãao, pai dos judeus e também de todos os monoteísta, cristãos e mulçumanos, foi alguém que OUVIU A DEUS e ENTREGOU-SE SEM RESERVA.

O lech lechá, ou seja, a saída da casa do pai, da terra confortável, para a caminhada rumo à terra prometida foi um ato de fé, mas repleto de virtuosismo e de total entrega.

A fidelidade absoluta no quase sacrifício de Isaac é outro comovente e heróico exemplo de total entrega.

O Novo Testamento, por seu turno, ensina-nos a entrega total de Jesus no madeiro da cruz, o cordeiro sem defeito oferecido em holocausto para expiação de todos os pecados dos homens.

Assim, a entrega total, aquela que possibilidade a construção da vida virtuosa, tem como mais rica e bela consequência, ao menso àqueles que têm fé, a união íntima com Nosso Senhor Jesus Cristo, isto é, união com o coração do próprio Deus.

A prática constante das virtudes permite a fusão do nosso coração ao Sagrado coração de Jesus. Essa fusão permite o entendimento das questões de fé, desarmando-nos do ceticismo e do psicologismo que tanto contaminam a pureza da fé.

São Tomás de Aquino, o pai da Escolástica, chamado pela Igreja de Doutor Angélico, disse: "quem tem prática das virtudes, entende Cristo".

Assim, à luz da razão, que caminha ao lado da fé, temos que estar convencidos, para a prática das autênticas virtudes, que:

a) sem a Graça de deus nunca conseguiremos as virtudes autênticas. O desejo é nosso, o esforço é nosso, a decisão é nossa, mas a Graça é de Deus e dela necessitamos para sermos virtuosos. Cada vez que falamos NÃO a Deus, estamos esvaindo a Sua Graça. Como disse e ainda nos diz São Paulo, o apóstolo dos gentios: TUDO POSSO NAQUELE QUE ME FORTALECE.

b) promazia das virtudes sobrenaturais, ou seja, aquelas ligadas ao campo da fé (a própria fé, a esperança e a caridade, as chamadas virtudes teologais, e, as que nasceram na Antiga Grécia mas assumiram contornos cristãos ao longo do tempo e segundo o magistério da santa Igreja: fortaleza, prudência, temperança e justeza/justiça).

O homem que quer se virtuoso não pode esquecer a importância da caridade, do amor, como virtude-mãe de todas as demais, pois sem amor, a prática das virtudes não se consubstancia. A Carta de São Paulo aos Corintios bem nos diz sobre isso.

Também como ensina eternamente São João, o evangelista, DEUS É AMOR, título que o Papa Bento 16 tomou emprestado para a primeira Encíclica do seu Pontificado.

O amor é a razão das virtudes. Virtudes que não são fundamentadas nos amor, no amor ágape, não são virtudes, mas simulacro de virtudes.

Trabalhar sem amor é o mesmo que nada. Ordenar-se sem amor é forma de desvio psicológico.

O amor cristão é o que verdadeiramente justifica e legitima as virtudes.

Um cuidado contudo deve ser tomado por aquele que deseja caminhar na estrada das virtudes, qual seja, os dois extremos opostos mas interdependentes: virtudes humanas sem as vestes das sobrenaturais (que traduzem no fim condutas estéreis) ou vidas supostamente "piedosas" sem as virtudes puramente humanas.

Em síntese: não devemos imitar o BOM PAGÃO, tampouco sermos o BEATO CLÁSSICO.

Em outras palavras: um comunista dificilmente poderá praticar uma virtude autêntica, mesmo que aparentemente bem-intencionado em sua ignorância ideológica, porque ele não crê em Deus e sua motivação deriva de um posicionamento político diabólico. Por outro lado, aquele beato clássico que passa o dia inteiro na Igreja, também não é um modelo de virtuosismo, ao menos se a sua fé não se traduz em atos concretos: trabalhador exemplar, marido e pai dedicado, bom amigo, bom filho, enfim um cidadão ativo e útil.

Finalizando, convém esclarecer que a prática das virtudes é para todas as ocasiões e compagina o conceito de unidade de vida.

Não se pode dizer que alguém é virtuoso quando a sua prática é pontual, para certas ocasiões e em certos meios.

Isso é um desvio de personalidade, pois não se pode levar vida dupla.

Quem é virtuoso é em todo momento, não tergiversa sobre seus valores de fé, de honra e de moral, vive imantado da "santa intransigência" e da invulgar inflexibilidade. A virtude, afinal, não é de ocasião, mas para todas as ocasiões.


Contando com a graça de Deus, quem deseja praticar as virtudes deve amar a luta em tal sentido, consciente, desde o início, que o condicionamento moral é mais duro e difícil do que o físico, exigindo esforços não raro sobrenaturais. Também tem que estar ciente de que é preciso alinhar a alma e corrigir os vícios o tempo todo, por toda a vida.

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