Por Carlos Ramalhete
Eu gosto muito de café, mas só de café sem açúcar.
A maior parte das pessoas prefere o café doce, com abundantes colheradas
daquele pó branco que me enjoa e, para mim, estraga o sabor de um bom café.
Dizem alguns que o café deve ser tomado sem açúcar,
por questões de saúde, de paladar, de estética, que sei lá eu. Eu sei é que eu
gosto dele sem açúcar. Esse gosto, contudo, é meu. Gostos podem e devem ser
diferentes: que se tome café com açúcar, com aquelas tristes gotinhas
penitenciais, com sal, com mel, com rapadura e canela, mas que, sobretudo, cada
um possa escolher como o prefere.
Essa escolha, que parece evidente, é cada vez mais
negada às pessoas. Não digo no caso do café, que aparentemente a voracidade
legiferante de nossos supostos representantes ainda não descobriu, mas em
outros campos é cada vez mais comum que tenhamos de seguir as regras impostas
por algum intrometido bem-intencionado. Em muitos lugares, por exemplo, as
crianças já não podem escolher o que comem na escola. E nem são os pais que
fazem a escolha, o que seria aceitável e natural em se tratando de crianças,
mas algum burocrata oculto: “sanduíches não são saudáveis; que comam maçãs”!
Do mesmo modo, o dono de um bar, em muitos lugares,
não pode mais escolher se quer ou não permitir que os seus fregueses fumem. Um
burocrata já decidiu por ele, já lhe negou o direito de escolher. Que sorte que
ainda não nos proibiram de escolher batata fritas nos restaurantes!
Afinal, quem não escolhe não pode fazer a escolha
errada. Quem nunca faz a escolha errada não aprende a escolher. Ora, a incapacidade
de escolha é a maior característica do escravo. Havia escravos que não
apanhavam, mas não havia escravos que pudessem escolher. Não vejo nada de
saudável em tratar quem quer que seja como escravo, nem uma criança nem um dono
de bar.
Quando os burocratas descobrirem o cafezinho e
quiserem proibir, ou ao menos controlar, as fartas colheradas com que os outros
estragam tão saborosa beberagem, reclamarei do mesmo jeito. A saúde é de quem a
tem, o gosto – ou mau gosto – é de quem faz a escolha. Sem escolha não há
liberdade, e negar a liberdade é negar a humanidade.
Vai um cafezinho, aí?
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