Por Carlos Ramalhete
As primeiras
universidades foram instituições religiosas. Do mesmo modo, os valores humanos
dos laicistas mais exacerbados – como a dignidade da pessoa humana, o valor da
vida ou a adesão a um código ético – são versões reduzidas e resumidas de
preceitos cristãos.
Contudo, em alguns
meios de intelectualidade rasa, é moda prezar os valores oriundos do
cristianismo e, ao mesmo tempo, desprezar a religião que os gerou. Antes dela,
na Roma pagã, por exemplo, a vida humana pouco valia: o pai tinha direito de
vida e morte sobre toda a família, e no circo o “palhaço” era morto por feras.
Se não fosse a ascensão do cristianismo, ainda hoje seria assim; se o
cristianismo desaparecesse, os valores humanistas também desapareceriam, por
falta de base. Sem sua base cristã, a única razão para aceitar estes valores é
“porque sim”.
O fato é que nossa
sociedade está passando por uma séria crise de adolescência, revoltando-se
contra as origens de tudo o que ela diz prezar. Esta crise também se reflete
nas universidades, de que um ou outro deseja expulsar a expressão religiosa.
Ora, ao negar o desejo humano de Deus, faz-se apenas com que falsos deuses –
partidos, “celebridades” ou teorias da moda – tentem inutilmente preencher o
vazio. Além disso, proibir alguém de professar sua fé no ambiente universitário
é tão arbitrário quanto exigir que se siga, obrigatoriamente, uma religião. É a
ditadura do laicismo.
Quando começou esta
separação artificial entre os valores que vêm do cristianismo e a fé que lhes
deu origem, há coisa de 200 anos, seus defensores ainda pregavam a necessidade
da crença religiosa como meio de garantir o bom comportamento da “massa
ignara”. Depois, nem isso mais admitiam: no Rio há ainda a Igreja Positivista
do Brasil, a que pertencia Benjamin Constant, que mantém uma imitação de capela
católica com Gutenberg e Descartes no lugar dos santos, qual museu de uma
tentativa frustrada de criar o homem sem Deus, há cerca de um século.
Hoje esta crise
adolescente está em seu auge, com a sociedade querendo negar a figura do pai –
Deus – e ver-se livre da figura da mãe – a cristandade –, sem aceitar que é
deles que vem. Pipocando como espinhas, ateus militantes vendem mentiras
requentadas e movimentos laicistas procuram impedir a expressão religiosa, sem
que percebam que estão atacando a religião em nome de valores que provêm dela
mesma, de valores que, antes da ascensão do cristianismo, seriam tidos por
loucura.
Universidade de Oxford. Seria bom buscar as origens do que hoje é o que conhecemos como sistema universitário. |
É pena, mas até mesmo
na universidade este tipo de contra-senso ainda aparece. É perfeitamente normal
que, como o adolescente que não precisa mais ser guiado pela mão ao atravessar
a rua, a universidade tenha se distanciado um pouco de suas origens. A
especialização extremada do ambiente acadêmico de hoje, em que o químico ignora
o que estuda o biólogo, também deixa pouco espaço para a discussão teológica,
forçosamente mais abrangente que os caminhos hoje separados das ciências. Mesmo
assim, apenas em meio a pessoas pouco afeitas ao raciocínio lógico seria
concebível não perceber a tremenda contradição que é pregar valores que vêm da
religião e ao mesmo tempo atacá-la; na universidade, seria de se esperar que
isto não acontecesse. Afinal, crises de histeria adolescente não ficam bem
sequer nos adolescentes, quanto mais em universidades.
O papel da religião na
universidade, assim, é cuidar para que ela não se distancie dos valores em que
se baseiam tanto ela quanto a própria sociedade ocidental. Como o tronco de uma
árvore, que comunica às raízes o que vem das folhas e às folhas o que vem das
raízes, a presença religiosa impede que a ciência perca seu norte ético. Para
tal, deve haver na universidade ao menos um chamado à oração e à meditação, um
reconhecimento explícito da necessidade de proteção divina (como há na
Constituição, aliás), uma capela, atos de culto oficiais e imagens
religiosas...
Em suma: apoio,
abertura e tolerância para com as manifestações religiosas de todos os que,
juntos, compõem este “universo de mestres e estudiosos” chamado universidade.
Só assim ela pode evitar a triste posição de adolescente mimado que renega a
origem de sua existência, valores e sobrevivência.
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